quinta-feira, 29 de agosto de 2013

As marcas do maior quarto

por Raíza Goi Borba

Elas vinham do interior para estudar na “cidade grande”. Pela frente um desafio: encontrar um imóvel para alugar. A tarefa não foi fácil, Amanda e Daniela, juntamente com seus pais procuraram em vários lugares, até que encontraram o Condomínio Bela Vista. Lá havia somente um apartamento disponível, era o 301, no bloco oito. Parecia a melhor escolha, o apartamento era claro, arejado e havia sido reformado recentemente. As meninas, que então ingressariam na faculdade, não entendiam o motivo pelo qual ninguém o alugava.
Mudança feita. O local era grande, com uma sala ampla, cozinha, banheiro e três quartos, um deles maior do que os demais. Amanda e Daniela estavam bem instaladas, afinal, para duas jovens o apartamento estava ótimo. Além disso, os vizinhos eram legais e o condomínio, seguro.
Daniela era comprometida. Seu namorado continuaria morando no interior e eles seguiriam com o relacionamento à distância. Inevitavelmente, o par da garota tinha medo de que Daniela se interessasse por uma pessoa da cidade e o esquecesse.
Iniciaram as aulas e a rotina das garotas era parecida: saiam de casa pela manhã para trabalhar, voltavam a tardinha e se arrumavam para ir até a faculdade. Daniela não tinha aula nas segundas e quartas-feiras, então, passava essas noites sozinha no apartamento. Sua distração era navegar na internet, olhar televisão e escutar música, até o sono aparecer e ela ir deitar. Porém, com o passar do tempo, as distrações de Daniela passaram a ser outras. A menina simplesmente não conseguia mais dormir de preocupação. Coisas estranhas estavam acontecendo no apartamento 301 do bloco 8.
Daniela ocupava o quarto maior. Em uma das noites que estava sozinha as venezianas da janela de seu quarto simplesmente se fecharam. Em função do barulho causado, a garota foi até o local ver o que havia acontecido. Ao entrar, a porta se fechou numa grande batida. Não tinha vento e nem outro fator que pudesse explicar o que estava acontecendo. A menina não conseguia sair de lá e o pânico tomou conta de sua mente. De tanto chorar, Daniela pegou no sono. Em seus sonhos, imagens do pátio do Condomínio com crianças pulando corda alegremente.
Pela manhã, Daniela acorda com um raio de sol em seu rosto, a janela estava aberta e a porta também. O que aconteceu? No que pensar?
- Acorda Amanda! Preciso te contar o que aconteceu comigo essa noite.
Amanda ouviu o que Daniela tinha pra contar, porém, não acreditou em uma só letra. Disse pra ela não se preocupar, pois tudo não passara de um pesadelo. Daniela tentou, mas não conseguiu se acalmar, passou o dia todo tentando entender seu sonho. Qual era o significado daquelas crianças pulando corda?
            Esta não foi a única vez que coisas estranhas aconteceram com a garota. Os dias em que Daniela não tinha aula passaram a ser uma tortura. As chaves saiam das fechaduras, os aparelhos eletrônicos paravam de funcionar, as lâmpadas estouravam constantemente. Porém, ninguém acreditava na menina. Seus amigos e seus pais achavam que era paranoia e até cogitaram a hipótese de levá-la para fazer um tratamento psicológico.
            Além da preocupação, outro sentimento ocupava o coração de Daniela: o amor. Mas não era o amor pelo seu namorado do interior. A garota havia se apaixonado por um colega de aula, que a tratava bem e preenchia o vazio de seu coração quando seu namorado não estava.
Tentando entender porque coisas estranhas aconteciam enquanto estava sozinha no apartamento 301, Daniela buscou ajuda. Primeiro, entrou em contato com a imobiliária para saber o nome e o endereço do proprietário do apartamento. Era a senhora Iolanda Prestes.
Com o pretexto conversar sobre possíveis ajustes que deveriam ser feitos, Daniela foi até a casa de Iolanda. Durante o diálogo, a garota percebeu que algo incomodava a senhora. Depois de muita conversa, a menina tomou coragem, e perguntou: O que a fez sair do apartamento?
Iolanda estufou o peito e respondeu:
- Minha filha, eu tinha uma família linda, dois filhos educados e um marido muito especial, que me amava acima de tudo. Me arrependo muito do que fiz.
Com os olhos lacrimejando, a senhora continuou:
- Me apaixonei por outra pessoa enquanto eu era casada. Mantive um relacionamento com este meu “amante” por um longo tempo, mas eu precisava continuar com o meu marido. Não podia me separar, não podia deixar as crianças tristes.
Dona Iolanda contou para Daniela a história mais triste de sua vida. Ao chegar no apartamento 301 após um dia de trabalho, a senhora deparou-se com seu marido morto no maior quarto. Ele havia se enforcado com a corda que as crianças brincavam de pular. Em uma carta deixada, o marido explicou o motivo do suicídio: ele havia descoberto que Iolanda o traía.
“Enquanto eu te amava acima de tudo, você vinha me matando com sua traição.”
A garota então descobriu o motivo de suas perturbações: assim como Dona Iolanda, Daniela também estava traindo um amor verdadeiro.

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